Cacau nas alturas: quem lucra mais e por que o chocolate está cada vez mais caro

Cacau nas alturas: quem lucra mais e por que o chocolate está cada vez mais caro

Cacau nas alturas: quem lucra mais e por que o chocolate está cada vez mais caro

Em 2024 e início de 2025, uma avalanche de más notícias abalou o mundo do cacau. Condições climáticas extremas, doenças das plantas e produção deficiente em países como Costa do Marfim e Gana esvaziaram estoques e elevaram os preços a patamares históricos. O resultado? Cooperativas e pequenos produtores brasileiros, especialmente em regiões como Bahia e Pará, viram seus rendimentos dispararem – enquanto os consumidores encontram cada vez mais dificuldade para aproveitar um simples tablete de chocolate.

E no Brasil?

No Brasil, cerca de 90 mil produtores familiares começaram a encerrar o ano com cifras positivas, incentivados pela valorização expressiva do cacau. Em 2024, os preços dispararam mais de 135%, atingindo até US$12.605 por tonelada, o dobro da alta do café – e esses níveis ainda se mantiveram no final do ano. As negociações no mercado internacional mantiveram valores elevados, acima de US$11 mil/t – o que garantiu ganhos substanciais à base produtiva nacional.

Externamente, a situação não era mais tranquila. A crise se intensificou com previsões de que os danos climáticos e as pragas derrubariam a produção na África Ocidental, principal polo global. Relatórios apontaram que os preços chegaram a atingir mais de 86% de alta em relação ao ano anterior, superando muito a média das últimas duas décadas. Algumas estimativas falam até em saltos de 163% para cacau e café, em um contexto de extrema volatilidade imposta pelas condições climáticas e instabilidade política.

Com toda essa tração, cooperativas e produtores puderam negociar melhores condições e valores para suas culturas. Aqueles que, por anos, enfrentaram preços baixos agora viram parte da cadeia, como intermediários, reduzir sua margem de dominância, pelo menos temporariamente.

Mas esse cenário trouxe um dilema doloroso: o consumidor é quem acaba pagando a conta. Chocolates começaram a ficar significativamente mais caros – com empresas como Hershey e Mondelēz absorvendo parte dos custos para evitar uma queda drástica no consumo, enquanto marcas menores fizeram ajustes diretos nos preços ou reduzindo o tamanho dos produtos. Em alguns mercados, consumidores chegaram a cortar o consumo de chocolate em quase metade.

A alta do cacau impactou também as estratégias de marketing

No Halloween, por exemplo, muitas empresas optaram por intensificar a oferta de balas de gelatina ou produtos menos dependentes do cacau, buscando manter a lucratividade sem repassar todo o aumento ao consumidor. Em outras ocasiões, houve modestas elevações de preço. No entanto, aceitas por consumidores que valorizam a qualidade – segundo relatos de pequenas chocolaterias que perceberam disposição em pagar mais por produtos premium.

Houve também uma leve melhora nos preços futuros conforme a produção se recuperou, mas o alívio é tímido. Em junho de 2025, os preços cederam de níveis recordes próximos a US$10,75/kg para cerca de US$9/kg, indicando uma breve trégua na escalada de valores. Mesmo assim, especialistas alertam que o mercado segue altamente volátil e vulnerável a novos choques climáticos, sanitários ou políticos.

Enquanto isso, o Brasil aposta em iniciativas ousadas para combater a dependência africana. Um exemplo é o ambicioso projeto em andamento na Bahia, que prevê criar a maior fazenda de cacau do mundo – com técnicas de cultivo em alta densidade e irrigação intensiva. A expectativa é elevar a produtividade de 500 kg/ha para até 4.000 kg/ha, transformando o país em um grande competidor global – embora não faltem questionamentos sobre os riscos sanitários e econômicos dessa escalada industrial.

Em resumo, o atual ciclo de alta do cacau beneficia quem está na ponta da produção – especialmente pequenas cooperativas e agricultores familiares que conseguiram preços melhores –, mas coloca pressão sobre o consumidor final, que enxerga preços mais altos nas prateleiras e muitos optam por alternativas mais baratas ou reduzem o consumo. O mercado global segue tenso, e a única certeza é a necessidade de adaptação em toda a cadeia, do campo à barra de chocolate.

Fonte da imagem: Freepik.

Henrique de Castro Neves
Henrique de Castro Neves

Doutor em ciências econômicas aplicadas, mestre em ciência e tecnologia do leite e bacharel em administração e ciências contábeis.