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Food Fraud: como elaborar?

Por: Keli Lima Neves

 

Food Fraud: como elaborar?

A fraude alimentar envolve práticas intencionais de adulteração, substituição ou rotulagem inadequada de alimentos com o objetivo de obter vantagem econômica. Um programa de Food Fraud tem o objetivo de identificar, prevenir e mitigar esses riscos, protegendo consumidores e garantindo a transparência no mercado.

Frequentemente ouvimos noticias de fraudes alimentares e alguns alimentos estão comumente envolvidos, como azeite, leite, suco de laranja, carnes e até condimentos.

Certamente todo profissional do Food Safety já se deparou com alguma situação de fraude e historicamente existem alguns controles na cadeia de alimentos específicos para detecção de fraudes, é o caso, por exemplo, das análises de fraudes no recebimento de leite nos laticínios.

Ocorre que, na medida que evoluímos nas técnicas de detecção, na contramão, infelizmente, sempre existem pessoas buscando novas formas de fraudar, com o objetivo de ganhos econômicos através de uma concorrência desleal, perigosa e criminosa.

Fraude é crime!

 

A Importância do Programa de Food Fraud

A fraude alimentar pode ter impactos graves para a saúde pública, para a economia e para reputação das empresas. Entre os tipos mais comuns de fraude alimentar estão a adulteração de alimentos (como diluir azeite de oliva com óleos mais baratos), falsificação de origem geográfica (como rotular vinhos ou queijos de regiões renomadas sem que realmente tenham origem nesses locais), a falsificação de rótulos que mascaram a verdadeira composição dos produtos, a adulteração de atributos de qualidade e de segurança dos alimentos com adição de substâncias que mascaram a condição verdadeira do alimento, usando substâncias não autorizadas.

 

Aqui estão algumas razões pelas quais o programa de Food Fraud é essencial:

  1. Proteção do consumidor: Alimentos fraudulentos podem conter substâncias não declaradas ou perigosas, colocando em risco a saúde dos consumidores.
  2. Garantia de integridade e qualidade: Empresas que se envolvem em práticas fraudulentas comprometem a qualidade de seus produtos e a confiança dos consumidores.
  3. Conformidade regulatória: Muitos países, como os Estados Unidos e a União Europeia, têm regulamentações rigorosas que exigem que as empresas implementem sistemas de controle para prevenir fraudes alimentares. No Brasil, o Ministério da Agricultura coloca, ainda de forma muito sutil, a necessidade de controle de fraudes no Programa de Autocontrole de materiais primas.
  4. Proteção contra perdas econômicas: A fraude alimentar pode causar perdas financeiras significativas para empresas e cadeias de suprimento, além de prejudicar a concorrência justa no mercado.

 

Como Elaborar um Programa de Food Fraud

 Desenvolver um programa eficaz de Food Fraud envolve várias etapas, desde a análise de vulnerabilidades até a implementação de medidas de controle. Abaixo alguns pontos básico para criar um programa robusto:

  1. Avaliação de Vulnerabilidades

O primeiro passo é realizar uma avaliação detalhada de vulnerabilidades de fraude alimentar, identificando pontos críticos na cadeia de suprimento onde a fraude pode ocorrer. Isso inclui:

  • Análise de fornecedores: Avaliar o histórico dos fornecedores, a origem dos ingredientes e a transparência nos processos.
  • Identificação de produtos de alto risco: Produtos com alto valor comercial ou complexos em termos de rastreabilidade (por exemplo, mel, azeite de oliva, carnes, leite e especiarias) são mais suscetíveis à fraude.

 

  1. Identificação de Riscos

Após a avaliação de vulnerabilidades, os riscos potenciais devem ser priorizados com base em fatores como impacto econômico, risco à saúde e a probabilidade de ocorrência. As ferramentas mais comuns para essa análise incluem:

  • Mapeamento da cadeia de suprimento: Entender como os ingredientes e produtos finais se movimentam entre fornecedores e consumidores.
  • Histórico de fraudes: Analisar registros de fraudes alimentares para identificar padrões e possíveis ameaças.

 

  1. Implementação de Medidas de Controle

Com os riscos identificados, é fundamental implementar controles para minimizar as oportunidades de fraude. Algumas medidas incluem:

  • Teste de autenticidade: Investir em testes laboratoriais que confirmem a autenticidade dos ingredientes e dos produtos finais.
  • Políticas de certificação e auditoria: Manter auditorias frequentes e exigir certificações de qualidade e segurança dos fornecedores.
  • Rastreabilidade e transparência: Utilizar tecnologias que permitam rastrear os produtos ao longo de toda a cadeia de suprimentos, garantindo maior transparência.

 

  1. Treinamento e Conscientização

Todos os funcionários, principalmente aqueles envolvidos na cadeia de suprimento, devem ser treinados para reconhecer os sinais de fraude alimentar e aplicar as melhores práticas de prevenção. Isso também inclui a conscientização sobre a importância da integridade dos alimentos e o impacto que a fraude pode ter na reputação e na saúde pública.

 

  1. Monitoramento Contínuo e Revisão do Programa

O programa de Food Fraud deve ser continuamente monitorado e revisado para garantir sua eficácia. À medida que novas ameaças e vulnerabilidades emergem, o programa deve ser atualizado e ajustado para responder adequadamente a esses desafios.

 

  1. Colaboração com Autoridades e Parceiros da Cadeia de Suprimentos

Manter uma boa relação com autoridades reguladoras e colaborar com parceiros da cadeia de suprimentos é essencial para identificar possíveis ameaças e mitigar fraudes. A troca de informações e boas práticas pode fortalecer o programa e prevenir incidentes.

 

Quais referências usar para construir o programa de Food Fraud?

A elaboração de um programa de Food Fraud é orientada por normas e regulamentos internacionais que estabelecem diretrizes para prevenir, detectar e mitigar fraudes na cadeia de suprimento alimentar. Abaixo estão algumas normas e documentos que orientam o desenvolvimento desses programas:

 

FSMA (Food Safety Modernization Act) – EUA

O Food Safety Modernization Act é uma legislação dos Estados Unidos, implementada pela Food and Drug Administration (FDA), que tem como objetivo prevenir contaminações de alimentos, incluindo a fraude alimentar. A Regra de Controles Preventivos para Alimentos Humanos exige uma avaliação de vulnerabilidades que abrange fraudes.

Disponível emFDA – FSMA

 

GFSI (Global Food Safety Initiative)

O GFSI é uma iniciativa internacional que define um quadro de referência para garantir a segurança dos alimentos, incentivando as melhores práticas na indústria de alimentos. Em 2018, o GFSI introduziu a exigência de que as empresas realizem avaliações de vulnerabilidades e implementem planos de mitigação contra fraudes alimentares. Os principais esquemas de certificação reconhecidos pelo GFSI como o esquema FSSC 22000, a BRCGS e a IFS trazem requisitos específicos sobre a implementação de um programa de Food Fraud.

 

FSSC 22000: Para a certificação FSSC 22000, um dos requisitos adicionais do sistema é a implementação do programa de Food Fraud e para auxiliar neste processo, um guia com orientações específicas foi publicado. Os Programas de Defesa dos alimentos devem ser desenvolvidos para reduzir os riscos de ameaças internas e externas, a fim de proteger os seus clientes.

Disponível emFSSC

 

BRCGS (British Retail Consortium Global Standard for Food Safety): Contém requisitos específicos para que as empresas conduzam avaliações de risco de fraude alimentar e implementem medidas de controle.

Disponível emBRCGS Standards

 

IFS (International Featured Standards): Padrão utilizado para certificação de Sistema de Segurança dos Alimentos, equivalente a BRCGS e a FSSC 22000 de acordo com o GFSI. Traz requisitos específicos sobre o combate a fraude alimentar e um guia com orientações específicas foi publicado.

Disponível em: IFS

 

ISO 22000:2018 – Sistema de Gestão de Segurança de Alimentos

A norma ISO 22000:2018 define requisitos para um sistema de gestão de segurança de alimentos, abrangendo todos os tipos de organizações na cadeia de alimentos. Embora a ISO 22000 seja focada principalmente em segurança alimentar (Food Safety), ela exige que as empresas façam uma avaliação abrangente de riscos, incluindo aqueles associados à fraude alimentar.

Disponível: ISO 22000

 

Série PAS 96:2017 – Guide to Protecting and Defending Food and Drink from Deliberate Attack

O PAS 96 é uma especificação publicada pelo British Standards Institution (BSI) que oferece orientações sobre como proteger os alimentos contra ataques deliberados, incluindo fraudes. Ele introduz o conceito de TACCP (Threat Assessment and Critical Control Points), que abrange a análise de ameaças intencionais, incluindo fraudes alimentares. O PAS 96 é amplamente utilizado pelas empresas que implementam o programa de Food Defense e Food Fraud.

Disponível emBSI PAS 96

 

Codex Alimentarius

Embora o Codex Alimentarius, criado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS), não seja focado diretamente em fraude alimentar, ele estabelece diretrizes gerais de segurança e integridade alimentar que incluem a prevenção de adulterações e fraudes. As recomendações do Codex são amplamente utilizadas como referência para normas de segurança e qualidade de alimentos em nível global.

Disponível emCodex Alimentarius

 

MAPA – Ministério da Agricultura

O Ministério da Agricultura estabelece, ainda de forma bastante discreta a necessidade de que os produtores de alimentos estabeleçam um programa de combate a fraude. Esta orientação vem apresentada em algumas legislações e normas como naquelas com as diretrizes para implementação dos programas de autocontrole.

 

Functional Food Defense Plans ou Plano de defesa alimentar funcional – FSIS – USDA – Department of Agriculture

Um plano de defesa alimentar funcional é uma ferramenta importante que um estabelecimento pode usar para prevenir, proteger, mitigar, responder e se recuperar de um incidente de contaminação intencional. No site do departamento são apresentados inúmeras orientações e materiais para auxiliar na construção e manutenção do programa.

Disponível em: FSIS USDA

 

Food Fraud Mitigation Guidance – USP

A United States Pharmacopeia (USP) publicou diretrizes específicas para mitigação da fraude alimentar, chamadas de Food Fraud Mitigation Guidance. Este documento fornece ferramentas e diretrizes práticas para ajudar as empresas a desenvolver programas eficazes de prevenção de fraude, oferecendo uma metodologia clara para avaliação de riscos e implementação de controles.

Disponível em: USP

 

Fraude Agroalimentar União Européia

A União Europeia tem uma série de frentes para o combate a fraude, que foram intensificadas após o escândalo da carne de cavalo. A ASAE – Autoridade de Segurança alimentar e Econômica (um órgão da Polícia Criminal) possui um sistema de controle e combate a fraude muito bem estruturado.

A EU Food Fraud Network (FFN)  foi criada em Julho de 2013, após a crise de carne de cavalo, é composta pelos 28 Estados-Membros (EM) da UE. A FFN permite a rápida e eficiente cooperação entre os Estados Membros.

Disponível em: EU Food Fraud Network (FFN) e ASAE

 

A fraude alimentar é uma prática que ameaça a saúde dos consumidores e prejudica a integridade da indústria alimentícia. Portanto, a criação de um programa robusto de Food Fraud é vital para mitigar esses riscos, garantir a confiança do consumidor e manter a conformidade regulatória. Empresas que investem em programas de Food Fraud mostram seu compromisso com a qualidade e segurança dos produtos que oferecem, preservando a reputação da marca e contribuindo para um mercado justo e transparente.

A criação de um programa eficaz de Food Fraud requer uma abordagem integrada que leve em consideração as vulnerabilidades em toda a cadeia de suprimento. O PAS 96 oferece uma estrutura clara para as empresas implementarem controles preventivos e garantir a integridade dos alimentos. É necessário, no entanto, entender as orientações de cada país e também dos requisitos específicos de certificações, quando este for uma demanda da empresa.

Ao seguir as etapas para elaborar o programa — desde a avaliação de vulnerabilidades até o monitoramento contínuo — as empresas podem reduzir significativamente os riscos de fraudes alimentares e assegurar que os consumidores recebam produtos genuínos e seguros.

 

Veja também:

Os alimentos mais fraudados no mundo.

Food Defense: como elabora?

Fontes: Estão destacadas e com links no texto.

Fonte da Imagem: Freepik

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