Glitter em doces: o brilho que esconde riscos para saúde

Glitter em doces: o brilho que esconde riscos para saúde

Glitter em doces: o brilho que esconde riscos para saúde

Glitter em doces: o brilho que esconde riscos para saúde — o que diz a ANVISA e como escolher o produto certo

As redes sociais e festas de aniversários foram tomadas por vídeos encantadores de bolos e doces cobertos por brilhos intensos e enfeites metálicos. Diante disso, o glitter, antes restrito ao universo de artesanato e da maquiagem, passou a ser protagonista também na confeitaria artística.

Entretanto o que parecia apenas uma tendência estética ganhou um alerta importante de influenciadores e um posicionamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA): nem todo glitter pode ser ingerido.

A Agência publicou, no dia 21.10.2025 um comunicado oficial reforçando que plásticos, incluindo o polipropileno micronizado (PP), não estão autorizados como componentes de alimentos. Desse modo, o alerta surgiu após a constatação de que muitos produtos utilizados na confeitaria continham partículas plásticas semelhantes às usadas em cosméticos e artesanato, mas sem aprovação para uso alimentar.

A tendência que virou risco

O apelo visual dos “glitters comestíveis” é inegável. Com isso, eles dão vida a bolos temáticos, doces de festas infantis e sobremesas “instagramáveis”.
No entanto, o problema é que o termo comestível nem sempre corresponde à realidade.

Assim, alguns pós brilhantes são fabricados a partir de materiais plásticos, como polipropileno (PP) ou PET micronizado e são comercializado lado a lado com produtos realmente alimentares. Desse modo, essa confusão entre “pó decorativo” e “pó para confeitaria” pode fazer com que confeiteiros e consumidores utilizem substâncias não autorizadas para consumo humano.

Segundo especialistas ouvidos em reportagens recentes, o brilho mais intenso e espelhado costuma indicar a presença de plásticos, e não de pigmentos alimentares. Ademais, embora muitos desses produtos sejam descritos como “não tóxicos”, isso não significa que possam ser ingeridos, apenas que não liberam substâncias nocivas em contato superficial.

O que diz a legislação brasileira

De acordo com o comunicado da ANVISA publicado em 21 de outubro de 2025, as normas brasileiras são claras:

  • Nenhum plástico, incluindo o polipropileno micronizado, está autorizado como ingrediente ou aditivo em alimentos.
  • Esses materiais podem ser utilizados apenas em embalagens ou utensílios que entram em contato com alimentos — e mesmo assim, apenas após avaliação de migração e segurança para aquele uso específico.
  • Produtos destinados à decoração de alimentos (como pós e glitters comestíveis) devem ser fabricados exclusivamente com ingredientes e aditivos autorizados pela ANVISA, de acordo com o Painel de Aditivos Alimentares e as Instruções Normativas nº 211/2023 e nº 286/2024, que atualizam as listas de corantes e aditivos permitidos.

O órgão também informou que acionou a Rede de Alerta e Comunicação de Riscos de Alimentos (REALI) para monitorar casos suspeitos e reforçar a fiscalização de produtos irregulares no mercado.

Implicações para a saúde

A ingestão de produtos que contêm plásticos micronizados pode representar riscos à saúde, especialmente quando consumidos com frequência.
Os chamados microplásticos vêm sendo estudados por cientistas do mundo todo, e já há evidências de que podem causar irritações gastrointestinais, inflamações e possíveis efeitos cumulativos no organismo a longo prazo. Além disso, produtos não alimentares não passam por controles de pureza, limites de metais pesados, ou avaliações toxicológicas exigidas para ingredientes alimentares.
Isso significa que, mesmo sem causar sintomas imediatos, o uso de glitters não comestíveis em doces quebra a cadeia de segurança dos alimentos e pode caracterizar infração sanitária.

Como identificar o glitter comestível verdadeiro

Antes de aplicar aquele brilho encantador no bolo, é essencial verificar se o produto é realmente seguro. Veja o que observar:

  1. Denominação de venda: o rótulo deve indicar claramente que se trata de produto alimentício, como “Corante artificial para fins alimentícios”, “Açúcar para confeitar” ou “Pó decorativo comestível”.
    Se estiver escrito “glitter decorativo”, “para festas”, “para artesanato” ou “uso cosmético”, não use em alimentos.
  2. Lista de ingredientes: produtos com polipropileno (PP), PET, PVC ou qualquer outro polímero plástico não são comestíveis.
    Busque fórmulas com ingredientes como maltodextrina, açúcar, corantes alimentares e similares (autorizados pela Anvisa).
  3. Rotulagem obrigatória: todo alimento deve apresentar lote, data de validade, informações de alergênicos, lista de ingredientes, dados do fabricante e declaração sobre presença ou ausência de glúten.
    A ausência desses dados é um sinal de que o produto não segue a legislação de alimentos.
  4. Origem e fornecedor: priorize marcas registradas, com CNPJ e identificação do fabricante. Evite produtos de origem duvidosa ou comprados a granel.
  5. Canal de venda: compre apenas em lojas e sites especializados em insumos para confeitaria — e não em papelarias ou lojas de artigos de festa.
Boas práticas para confeiteiros e decoradores

Diante disso, mesmo com o glitter comestível correto, o uso deve ser cuidadoso e moderado.

Algumas recomendações:

  • Aplique o produto apenas na superfície do alimento, evitando misturar em grandes quantidades na massa ou recheio.
  • Separe os insumos alimentares dos não alimentares no estoque para evitar confusões.
  • Higienize os utensílios e mantenha as embalagens bem fechadas, longe de umidade.
  • Treine a equipe sobre a diferença entre produtos comestíveis e decorativos.
  • Comunique ao cliente se utilizar adornos não comestíveis (como toppers, laços ou decorações de glitter sintético).
  • Considerando o cenário atual: mostre para o cliente os dados do glitter que você está utilizando para deixa-lo seguro sobre o consumo.
Conscientização e cultura de segurança dos alimentos

O caso do glitter é um exemplo claro de como o encantamento visual não pode se sobrepor à segurança dos alimentos.
Assim como o uso de corantes, conservantes e aditivos deve seguir critérios técnicos, o mesmo vale para os efeitos decorativos.
Portanto, em um mercado cada vez mais competitivo e visual, o profissional de confeitaria precisa aliar criatividade à responsabilidade sanitária.

O brilho é bem-vindo, desde que não traga riscos a saúde.

 

 Referências
  • ANVISA (2025). “Anvisa esclarece: plásticos não estão autorizados como componentes de alimentos.” Disponível em: https://www.gov.br/anvisa
  • Instrução Normativa nº 211/2023 e IN nº 286/2024 — listas de aditivos e corantes autorizados.
  • Correio Braziliense (2025). “Plástico na comida: Anvisa explica sobre glitter em alimentos.”
  • Revista Saúde (Abril, 2025). “Glitter comestível pode conter plástico: cuidados ao decorar doces.”
  • O Tempo (2025). “Seu filho está comendo plástico e você não sabia.”
  • Painel de Aditivos Alimentares – ANVISA. Consulta pública online para ingredientes e funções permitidas.

Fonte da imagem: Freepik.

Keli Lima
Keli Lima

CEO da BR Quality e Estilo Food Safety, especialista em Qualidade e Segurança dos Alimentos. Atua como consultora, mentora e auditora líder em normas de Food Safety e ESG.