Bisfenol F em embalagens metálicas: o que você precisa saber sobre esse novo composto autorizado pela Anvisa

Em junho de 2025, a Anvisa autorizou o uso do Bisfenol F em embalagens metálicas, ou seja, revestimentos internos de latas de alimentos e bebidas. Embora essa decisão esteja tecnicamente embasada pel ANVISA, ela acende um alerta importante para profissionais da área e também para consumidores. O que é o BPF? Quais são os possíveis riscos à saúde? E como garantir a segurança dos alimentos diante de mais essa substância? Além disso muitos pesquisadores não compactam desta decisão.

O que é o Bisfenol F?

O Bisfenol F (BPF), químico estruturalmente semelhante ao BPA, tem sido adotado por indústrias como alternativa em revestimentos internos de latas metálicas usadas para bebidas, devido à sua capacidade de formar resinas epóxi que protegem o conteúdo e impedem a corrosão.

O BPA, como se sabe, foi progressivamente banido em diversos países devido à sua possível interferência no sistema endócrino humano. Com isso, outras versões começaram a ser estudadas como alternativas — e é aí que entra o BPF.

No entanto, o BPF também apresenta potencial de disrupção endócrina, com evidências de efeitos em modelos animais e de atividade semelhante ao BPA .

Segundo a Anvisa, o uso do Bisfenol F em embalagens metálicas agora está permitido no Brasil em quantidades controladas, no revestimento interno de latas para alimentos e bebidas.

Mas o BPF é seguro?

Embora autorizado, o BPF ainda está sob avaliação científica quanto aos seus efeitos no organismo humano. Estudos já sugerem que ele pode atuar de forma semelhante ao BPA, afetando sistemas hormonais, reprodutivos e metabólicos em determinadas condições de exposição.

Estudos apontam que revestimentos que usam BPF/BPS liberam monômeros não reagidos e subprodutos (NIAS), similares ao que ocorre com o BPA, e esses compostos são migratórios para o conteúdo da lata.

O BPF foi detectado na urina de mais de 60% da população adulta em países europeus.

Apesar de suas qualidades para revestimento, um relatório da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) aponta que o BPF pode provocar impactos hormonais similares aos gerados pelo BPA.

Antes de liberar o Bisfenol F, a Anvisa promoveu uma consulta pública, entre 29 de março e 13 de maio de 2024, para colher sugestões da indústria e da sociedade civil. Manifestações contrárias a aprovação foram enviadas à agência e essa informou que considerou todas as manifestações para tomada de decisão.

A Anvisa, após avaliações informou que definiu limites seguros de migração do BPF para os alimentos, exigindo que fabricantes cumpram com rigor os testes de segurança.

Regulamentação: quem permite, quem proíbe

União Europeia
  • A União Europeia, não permite o uso de Bisfenol F em materiais destinados ao contato com alimentos, conforme o Regulamento (UE) nº 10/2011.
  • Antes disso, o limite específico de migração para BPA e seus análogos (incluindo BPF/BPS) já havia sido reduzido para 0,05 mg/kg conforme Regulamento 2018/213
  • Países como França proibiram completamente o BPA em revestimentos alimentícios desde 2012–2015, prática extensiva aos bisfenóis como grupo.
Estados Unidos
  • A regulamentação da FDA ainda permite epóxis bisfenólicos, incluindo BPA e possivelmente análogos como o BPF, desde que atendam aos limites de migração estipulados em 21 CFR 175.300.
  • Califórnia exige aviso de Proposition 65 para produtos que contenham BPA, mas não proíbe o produto em si .
Japão
  • No Japão, indústrias começaram a substituir voluntariamente o BPA por PET para revestimentos de latas já em 1998.

O que muda na prática?

Se você trabalha com segurança dos alimentos, controle de qualidade ou está envolvido no setor de embalagens e suprimentos, essa atualização exige atenção:
• Revisão de fornecedores e matérias-primas
• Verificação da conformidade com os limites estabelecidos pela Anvisa
• Atualização de processos de rastreabilidade e rotulagem
• Capacitação da equipe sobre substâncias químicas emergentes

Cuidado com os resultados de teste de migração, estes devem ser realizados nas temperaturas que os alimentos são possivelmente expostos.

Recomendações

  1. Monitorar níveis de migração (testes em alimentos simulantes).
  2. Realizar estudos toxicológicos comparativos, especialmente com gerações futuras.
  3. Avaliar e adotar alternativas comprovadamente seguras, preferencialmente livres de bisfenóis.
  4. Acompanhar a evolução regulatória, especialmente nos blocos com restrição crescente, como a UE.

Por que isso importa?

Aqui no Semear, acreditamos que semear conhecimento é o primeiro passo para construir uma cadeia alimentar mais segura e consciente. Ao entender como decisões regulatórias afetam a composição dos alimentos, conseguimos gerar impactos positivos do campo ao consumidor final.

Referências principais

  • OECD ENV/CBC/MONO(2022)43 – revisão de riscos e regulamentações de bisfenóis.
  • Food Standards Agency (UK). Safety assessment of TMBPF-DGE (27 nov 2024) food.gov.uk.
  • Regulamentos da UE: Reg. 2018/213 e Reg. 2024/3190 sobre limites migratórios e proibição de BPA e análogos pmc.ncbi.nlm.nih.gov+1mdpi.com+1.
  • Estudos de migração e toxicologia: PMC 7760808, PMC 10217381 pmc.ncbi.nlm.nih.gov+1pmc.ncbi.nlm.nih.gov+1.
  • Notícias da indústria sobre alternativas sem bisfenóis (PPG, AkzoNobel).
Keli Lima
Keli Lima

CEO da BR Quality e Estilo Food Safety, especialista em Qualidade e Segurança dos Alimentos. Atua como consultora, mentora e auditora líder em normas de Food Safety e ESG.