Pesquisadora da USP alerta para o risco da substituição por gorduras saturadas que, embora sejam menos nocivas à saúde, podem aumentar os níveis de colesterol ‘ruim’, o LDL, entre outras consequências, se o consumo for excessivo.
Fonte: Alimentos sem mitos
A Anvisa publicou a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 632/2022, que dispõe sobre a restrição do uso de gorduras trans industriais em alimentos. A medida é resultado do processo de revisão e consolidação de atos normativos, cujas diretrizes estão estabelecidas no Decreto 10.139/2019. A RDC 632/2022 consolidou a RDC 332/2019 e a RDC 514/2021. Ou seja, não houve alteração de mérito das normas. Os objetivos da iniciativa foram a melhoria da técnica legislativa e maior clareza normativa.
Por isso, os produtos alimentícios desde o início deste ano produzidos no Brasil ou importados, não podem mais conter gordura parcialmente hidrogenada, a principal fonte de gorduras trans industriais nos alimentos.
Mas será que os alimentos industrializados realmente se tornaram saudáveis neste aspecto?
Pode ser que não, se a conduta dos fabricantes for semelhante à observada em uma pesquisa da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP), realizada entre os anos de 2018 e 2022 no segmento de bolachas recheadas e wafers.
Ácidos graxos (gorduras) trans
Estão relacionados com doenças cardiovasculares e diabetes do tipo 2, além de infertilidade e problemas no desenvolvimento do feto, caso a mãe consuma esse tipo de gordura na gestação e no período de amamentação. Evidências científicas demonstram que não existe um limite seguro para o seu consumo, e a Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda sua eliminação da dieta.
Produtos ‘zero trans’
Até o ano passado, para um produto trazer a alegação ‘zero trans’ em seu rótulo era preciso atender as exigências de outra resolução da Anvisa, a RDC nº 54 de 2012. No caso, conter valores iguais ou menores que 1,5 gramas na soma de gorduras trans e saturadas por 50 gramas de alimento, e 0,1 gramas de gordura trans na porção (30 gramas) — com variação máxima de até 20% (RDC 360 da Anvisa). No entanto, conforme apontou a pesquisa, várias marcas de bolachas recheadas e wafers comercializaram produtos em inconformidade com a legislação, colocando em risco a saúde do consumidor.
O estudo
O estudo foi feito pela farmacêutica Tamires Carvalho Lins Montilla, sob a coordenação do professor Jorge Mancini-Filho, do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da FCF-USP. Foram analisados os teores de ácidos graxos trans e saturados em 118 bolachas recheadas e wafers, usando cromatografia gasosa – um conjunto de técnicas que permite a separação e a quantificação de compostos químicos.
Problema de fiscalização
Para a pesquisadora, há um problema grave de fiscalização. “Hoje a Anvisa não faz avaliações periódicas dos produtos, o que abre brecha para que possam ser alterados depois da análise”, afirma. Montilla considera que o banimento das gorduras trans, caso seja cumprido, trará ganhos à saúde do consumidor. “No entanto, se houver a substituição das gorduras trans pelas saturadas, permanecem os riscos de desenvolvimento de doenças cardiovasculares, ainda que em menor grau”, aponta.
Segundo a pesquisadora, as gorduras saturadas, em comparação com a trans, diminuem os riscos do aparecimento de doenças cardiovasculares em 17%. “De qualquer forma, ela não é saudável, pois não reduz os índices de HDL, conhecido como o ‘colesterol bom’, mas segue aumentando o LDL, o ‘colesterol ruim’”, complementa.
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